domingo, 5 de setembro de 2021

O Exercício da Colegialidade nas Equipes de Nossa Senhora | IV – EXERCÍCIO DA COLEGIALIDADE


 A colegialidade não pode subsistir senão por uma vivência e por um exercício permanente, que incluem certo número de passagens obrigatórias.

A colegialidade é, antes de tudo, um estado de espírito e uma atitude a ser desenvolvida, mais que um método. Ela deve implicar:

- uma busca comum da verdade, 

- uma busca de comunhão e de consenso, 

- o estabelecimento de uma confiança, 

- um processo de responsabilização e de decisão, 

- uma aceitação sem reservas da decisão comum. 

A) Busca em comum da verdade 

Trata-se de uma tentativa para compreender e viver a vontade de Deus sobre o Movimento. Ela comporta duas etapas essenciais: 

- Uma etapa de coleta de dados necessários à análise de problemas e situações que se apresentam em qualquer serviço que estejamos. 

Isso supõe: 

• Que tenhamos em conjunto uma linguagem clara e autêntica que se exprime numa grande caridade e correção fraterna. 

• Que cada membro do Colégio esteja atento às necessidades e expectativas dos equipistas e esteja em ligação permanente com eles diretamente ou por intermédio das estruturas que nos oferece o Movimento (a ligação). 

• Que todos juntos e na comunhão, nos sintamos responsáveis pela caminhada do Movimento no caminho para o Mundo (a corresponsabilidade). 

• A humildade e o desapego: ninguém é o detentor único da verdade e, antes de tudo, é o bem das Equipes que conta.

• Que saibamos beneficiar o Movimento das nossas diferenças que se exprimem na riqueza dos nossos dons, das nossas capacidades e da personalidade de cada um. 

• Que as diferenças de temperamento e de mentalidade sejam para nós um trunfo para ter um olhar fraterno sobre “o outro”. 

• Que não estejamos preocupados senão com a qualidade do nosso serviço e isso fora de toda a procura de poder. 

• Que saibamos fazer passar para segundo plano o fato de pertencermos a um país ou a uma cultura, para assim poder trazer ao debate as suas riquezas e não as suas reticências.  

- Uma etapa de verdadeiro discernimento

A procura da verdade desemboca muito naturalmente no necessário discernimento que deve comportar toda a decisão. É, pois, uma avaliação completa que é preciso fazer, em referência à vocação e aos objetivos do Movimento. Este discernimento só é possível com a condição de estarmos intimamente convencidos de que é Jesus Cristo quem nos reuniu. É por isso que a vida das nossas equipes e do colégio deve ser condicionada pelos tempos fortes e habituais da vida das Equipes de Nossa Senhora.

 Deve-se utilizar o tempo adequado e necessário para um bom discernimento, evitando os obstáculos que alongariam a reflexão, diluindo assim o debate numa interminável procura de consenso, ou a impulsividade excessiva, ocultando os componentes essenciais da decisão.

Nós os convidamos a organizar seus encontros como o fazemos atualmente na ERI, respeitando estes tempos principais:

A oração partilhada, que permite obter o dom da clarividência para sermos bons administradores e gerir melhor esta “herança viva e preciosa” que são as Equipes de Nossa Senhora.  

• A coparticipação, para conhecer melhor nossos irmãos de equipe, sua sensibilidade, seu estado de vida, para permitir assim a correção fraterna indispensável a toda a vida de equipe, e para permitir também reforçar o espírito de amor e de entreajuda fraterna, e de compreensão recíproca, o que é indispensável a toda a vida de equipe.  

• A partilha espiritual, sem a qual não poderá haver verdadeira unidade na diferença e complementaridade.  

• A consciência forte da nossa missão, apoiada sobre a formação, condição e até medida do anúncio missionário do Evangelho, que nos é confiada a serviço dos casais e das famílias.

B) Procura de comunhão e de consenso

Procurar a comunhão quer dizer aprofundar sempre mais o encontro entre nós. É preciso procurar sem cessar a comunhão e não a uniformidade. É da complementaridade que nasce a comunhão. Ela não significa nem nivelamento, nem negação do caráter “único” de cada membro do colégio, seja da ERI, seja de qualquer equipe.  

• “A pluralidade não deve causar nem divisão, nem justaposição, mas fazer nascer e alimentar a reciprocidade e a coordenação” (Cristifideles Laici 20).

 • A comunhão é, pois, uma responsabilidade e uma graça dada pelo Senhor, um dever confiado à guarda de cada um de nós. O seu crescimento não pode deixar de ser o fruto do espírito e a nossa resposta fiel e generosa ao Senhor.

• “Que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em mim e eu em Ti. Que eles estejam em nós, a fim de que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo 17,21). 

• A comunhão abre-se à missão, por isso ela é indispensável para que possamos participar na nova evangelização. A natureza missionária da Igreja, que parte do Cristo, encontra referências no Magistério da Igreja, que visa a promover a comunhão, garantindo a unidade de todos os fiéis em Cristo. Com a aprovação da Santa Sé, a Equipe Responsável Internacional recebe esta missão e este serviço de garantir a unidade do Movimento no Cristo.


C) O estabelecimento de confiança

É a condição “sine qua non” da verdadeira decisão partilhada e colegial. A colegialidade é diferente da democracia; ela repousa na harmonia. Porque ela implica a vontade de escolher em conjunto e chegar a uma decisão comum. A confiança repousa na certeza de partilhar um objetivo comum. A colegialidade encontra a sua fonte na confiança. Sem ela, cada membro de uma equipe entra num sistema de verificação do trabalho do outro. Este sistema de desconfiança permanente não pode ser o modo de funcionamento, mesmo excepcional, para um Colégio. Sobre este assunto do trabalho colegial, poder-se-á ler com proveito as páginas 14, 15, 16, 17 e 18 do documento “A Responsabilidade nas Equipes de Nossa Senhora”.

 A confiança reside também na transparência em nossas reflexões e em nossas tomadas de posição. É por isso que nos parece indispensável que o Colégio Internacional leve muito em conta o alcance de todos os eixos prioritários fixados por ocasião das suas reuniões anuais. Isto implica uma nova leitura final e atenta dos atos e decisões do colégio. 

As entidades super-regionais, regionais ou os setores ligados à ERI, são o lugar privilegiado do exercício da colegialidade e do espírito de comunhão com o Movimento na Igreja universal: isso devido à competência dessas instâncias na resolução dos problemas locais de organização ou de gestão das Equipes de Nossa Senhora, na escolha e no chamado dos novos responsáveis, e na animação do Movimento. 

As relações entre as regiões, as super-regiões e os setores devem ser caracterizadas por uma colaboração fraterna e por uma real preocupação pastoral com respeito aos serviços e competências de cada um. 

D) Processo de corresponsabilidade e de decisão

Será à frente da Super-Região ou da Região que se deve situar a missão do casal responsável? Ou ele é, antes de tudo, membro do Colégio Internacional, Super-Regional, ou Regional, e a esse título corresponsável do Movimento e da sua unidade? 

A questão do papel do responsável de Equipe, de Setor, de Região, de Província, de Super-região, em relação à sua equipe e em relação ao conjunto do Movimento interpela-nos, portanto. 

Para medir o quadro da responsabilidade de cada um, convém distinguir o que resulta do processo de decisão, da responsabilidade de ter ou de assumir uma decisão tomada colegiadamente. 

a decisão

O processo de decisão deve ser entendido como uma reflexão mediante a discussão e não como um simples debate de opinião ou convicção. Uma decisão deve ser o resultado de um processo, que se fundamenta no princípio de um confronto de argumentos e de contra-argumentos entre vários atores, que aceitam, num dado momento, um ponto de vista ou uma decisão que podem ser diferentes da sua posição inicial.

A discussão é um trabalho da razão, que põe em ação racionalidades diferentes e complementares. Ela permite a elaboração, dentro de um tempo suficiente, de um espaço público crítico que fundamenta, ou pelo menos justifica, as razões dos atos decididos.  

“Partindo de abordagens diferentes e mesmo de convicções diversas, é preciso que busquemos juntos chegar a um consenso que unifica (...). Isto é particularmente importante para os assuntos concernentes à vocação profunda e aos objetivos do Movimento. O que buscamos, em cada decisão, é aderir à vontade de Deus”.

Se o princípio de discussão é respeitado, permite com todo o rigor obter um acordo de conjunto dos membros do Colégio implicados na discussão, acordo chamado de consenso. O consenso é o resultado procurado, mas a sua obtenção não deve, porém, tornar insípida a discussão.  

O consenso não é um princípio ético suficiente se for mal empregado. Pode ser – e é esse então o seu limite – a expressão de uma ideologia de grupo, o produto de uma dominação hierárquica ou carismática de um ou de vários membros desse grupo.

Devemos defender a ideia de que um só não pode ter razão contra todos. 

O tempo concedido à tomada de decisão deve permitir a distância necessária para a compreensão das situações, sejam elas humanas, sociais, sejam espirituais. Nem mesmo a discussão garante à decisão tomada a certeza da sua absoluta legitimidade. Possibilita, porém, uma seriedade e um rigor que não poderíamos dispensar. 

A discussão, porque exige que se tome em consideração argumentos do conjunto dos atores como força crítica, é condição imperativa para que o processo de decisão se exerça de maneira harmoniosa, colegial e precisa.

  


A responsabilidade

O exercício da responsabilidade fundamenta-se no sentido de serviço e não na autoridade. Ela se desenvolve pela prática da colegialidade; portanto o papel do casal responsável pode determinar-se nos seguintes pontos:

• A sua primeira função em todos os níveis da organização é trabalhar em equipe. Por isso, o Casal Responsável deve esforçar-se por estimular a amizade e a confiança entre todos os membros da equipe. A coparticipação revela-se um instrumento muito útil a esse respeito, mas a oração é também indispensável, “pois sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). 

• O Casal Responsável deve esforçar-se por descobrir e estimular os dons particulares de cada um dos membros de sua equipe, casais e conselheiro espiritual, a fim de permitir a cada um pôr ao serviço da equipe a sua própria capacidade. 

• A função de animação do Casal Responsável obriga-o a estimular a reflexão pelo estudo e pela discussão dos diferentes temas de que a equipe se ocupa. Deve garantir a expressão livre das ideias de cada um dos membros da equipe. 

•O Casal Responsável deve agir com toda a caridade fraterna, agir como conciliador entre os membros da equipe, cada vez que as diferentes posições sejam divergentes, a fim de trabalhar para a obtenção de um consenso. 

• Quando o processo colegial não puder chegar a um consenso, e ele for necessário para a equipe, o Casal Responsável deve tomar a decisão final em consciência, em nome da sua responsabilidade. Mas deve fazê-lo na oração, em estreita união com o Espírito, e sempre em espírito de serviço. 

• Nem todos os aspectos, nem todos os detalhes dos assuntos que dizem respeito ao nosso Movimento podem ser objeto de decisões adotadas colegialmente. Se “também é certo que o trabalho em colegialidade não dispensa o Casal Responsável de sua missão própria, que é tomar e assumir a decisão final quando o processo colegial não pode chegar a um consenso” , existem ainda outros casos ou assuntos que não dizem respeito diretamente à vocação profunda, aos objetivos e à pedagogia do Movimento, nos quais o Responsável deve exercer plenamente seu papel. 

 Finalmente, “a colegialidade não anula a missão do Casal Responsável que, em cada nível da organização, é o sinal visível da unidade da equipe”.

E) A decisão comum 

Uma decisão tomada no quadro da colegialidade compromete todos os membros responsáveis do Colégio que estão encarregados, segundo sua missão, de velar para que ela seja aplicada no espírito e segundo as modalidades que presidiram à sua determinação. 

Isso implica que a decisão seja bem compreendida, e que depois, ninguém queira trazer-lhe modificações que alterariam a decisão. Somente adaptações locais são possíveis, desde que previstas e aprovadas, e estendidas apenas ao perímetro da decisão.

 A solidariedade entre todos os membros de um mesmo Colégio, e do nosso em particular, é essencial, porque ela é a garantia do espírito de serviço e de entreajuda que caracteriza o nosso Movimento. 

Nenhuma entidade do Movimento pode, sem prejudicar a saúde de todo o corpo, modificar ou tomar iniciativas que ponham em perigo as Equipes de Nossa Senhora na sua organização, nos seus princípios fundadores, na sua disciplina ou nos seus métodos. 

Isto supõe, portanto, uma perfeita lealdade de uns para com os outros. Está aí o prêmio da unidade do nosso Movimento, que deve encontrar sua fonte na unidade das nossas equipes e do Colégio e, portanto, no amor que nos une. “Vejam como eles se amam”. 

F) Avaliação

Para que a colegialidade seja vivida num verdadeiro espírito de serviço, na continuidade com o espírito das Equipes de Nossa Senhora e em fidelidade a esse espírito, deve ser objeto de uma avaliação periódica por parte daqueles que a vivem em todos os níveis de serviço. Esta avaliação do trabalho colegiado poderá ser conduzida por cada instância de responsabilidade, equipe regional, super-regional, provincial, nas zonas de ligação, na ERI e no Colégio. 


Retirado do Acervo de Formação do site das ENS (ens.org.br). O próximo capítulo será publicado em breve, mas caso queira ler na íntegra, acesse o link https://www.ens.org.br/site/arquivos/acervo/O_Exercicio_da_Colegialidade_nas_ENS.pdf

Veja também as publicações anteriores sobre este mesmo assunto na página principal do blog.

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